O título acima não é uma ameaça, pois isso não é algo necessariamente ruim. E não precisa ser especialista para saber que as crianças, não importa tempo ou lugar, sempre foram verdadeiras esponjas com relação a tudo o que ocorre à sua volta. Então basta garantir que as crianças tenham tudo lindo e amoroso à sua volta e tudo ficará bem, certo? Sim e não. Explicaremos.
É na infância que começamos a construir as bases para nossa vida adulta, mas nem sempre os adultos que nos orientam prestam muita atenção nisso. Garantir um ambiente seguro com base no respeito e na equidade é algo muito importante, mas nem sempre isso é possível.
O cenário econômico e social do Brasil é um agravante, pois os pais cada vez mais se desdobram para terem o básico em suas casas e, muitas vezes, não conseguem suprir os pequenos em outros aspectos desejáveis e também muito importantes.
Mas não há motivo para culpa. Nem mesmo no lar mais rico e amoroso do mundo é garantido que as crianças crescerão perfeitas, sem nenhum detalhe a ser melhorado no futuro. Não há perfeição. E não são apenas os aspectos externos que determinam o que uma criança será quando adulta.
E é justamente sobre os aspectos "não palpáveis" que falaremos a seguir.
Confiança é algo que se constrói
Procure não enganar uma criança. Não é porque ela é ingênua que você pode tirar proveito disso sempre. Quando a verdade vier à tona, o sentimento de traição poderá deixar marcas difíceis de serem superadas na vida adulta. No mínimo poderá surgir um adulto mais desconfiado que a média e, no limite, você irá colaborar para criar um ser humano com dificuldade de confiar em si mesmo. E isso, por si só, já é muito ruim.
Ao invés de ludibriar, enganar e mentir, busque ser sincero e claro. Combine com a criança, negocie. Desde muito cedo elas testarão você (e o mundo) sobre o que podem ou não ter, fazer, experimentar. Vá buscando formas de dizer a verdade a cada fase, negociando coisas e situações.
Mostre a elas a cada momento que a sua palavra tem valor. Se não der para cumprir algum destes combinados, explique, ofereça opção, se desculpe. Dá trabalho, mas o resultado futuro tende a ser muito melhor do que "mentirinhas inocentes".
Esteja sempre presente (de alguma forma)
É saudável que a criança tenha um tempo somente para si, que aprenda a brincar sozinha, dormir sozinha e outras atividades sem auxílio de ninguém. Mas é fundamental que os pais ou tutores sejam presença constante, estando ou não ao seu lado por muitas horas.
O processo de crescimento implica em confiança (como dissemos acima) e isso demanda presença. As crianças querem a atenção dos mais velhos, de quem pode atende-las, ajuda-las, conversar e brincar com elas. E a cada negativa a criança tem que encarar uma expectativa frustrada para ser absorvida. Isso é bom em alguma medida, ajuda a entender que há tempo para tudo, mas o excesso de ausências e impedimentos pode gerar uma criança solitária, tímida e com dificuldade de se relacionar com os demais.
As possíveis soluções seguem a mesma lógica já descrita no item anterior: combine e cumpra com o tempo que passarão juntos. E não adianta estar ali, de corpo presente, e ficar no celular enquanto a criança brinca ou demanda sua atenção. Eles entendem muito bem quando estão ou não sendo atendidos.
Nos terreiros de Umbanda, por exemplo, é cada vez mais comum destinar um espaço para as crianças interagirem enquanto os pais trabalham como cambones, médiuns, dirigentes ou estão ali para se consultar. Nestes casos, a maioria se sentirá segura por estar junto aos pais e adultos, mesmo não ficando grudados a eles o tempo todo.
E não esqueça de leva-los até a presença do Guia incorporado para, no mínimo, tomar um passe. A experiência religiosa com as crianças desde cedo é muito importante para que a Umbanda seja parte ativa de suas vidas também no futuro.
É engraçado ver a cara dos menores nas Giras de Erês nos Terreiros, por exemplo. Muitos ficam chocados com a bagunça gostosa promovida pelos médiuns para, em seguida, desejarem se jogar na Gira e brincarem ali com os adultos com jeito de criança.
Deixe as crianças participarem do seu dia a dia, integre-as ao máximo em suas atividades. Afeto é muito mais do que dizer "eu te amo" ou encher de presentes. O melhor presente é estar presente.
Compreensão (errar é humano)
A paciência anda curta, não é mesmo? Que atire a primeira pedra o pai ou mãe que nunca levantou a voz ou teve vontade de dar umas boas palmadas numa criança. Haja espírito de Preto Velho para aguentar certas situações, não é mesmo?
Mas, novamente, é preciso atenção. Crianças que foram muito censuradas por seus pais costumam se transformar em adultos que se recriminam em excesso, achando sempre que nunca estão fazendo o suficiente. No limite serão adultos infelizes, nunca satisfeitos com nada. Chatos, para simplificar.
O excesso de broncas, brigas e censuras pode gerar crianças que crescerão com uma tendência a ter baixa autoestima ou até adultos com excesso de preciosismo, incapazes de aceitar um erro sequer. Sabe aquela pessoa que você faz um elogio sincero e sonoro e ela fica completamente encabulada, achando que não merece? É por aí.
As críticas devem ser ponderadas, lembre-se disso. Mesmo quando a criança erra ou faz algum ruim por pura pirraça, lembre-se que o mundo para elas é algo novo a ser testado. Você é o adulto e deve procurar agir com equilíbrio.
Mostre o caminho, destaque as consequências, aponte como fazer mais e melhor. Bote a mão na massa, faça junto e valorize qualquer evolução, mesmo que mínima. Os erros só serão ruins se paralisarem a ação. Mostre que errar é degrau para o acerto. Mas é preciso continuar fazendo, agindo, trabalhando.
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Estas experiências da infância merecem toda a nossa atenção, pois podem ser difíceis de modificar quando adultos. No entanto, isso não quer dizer que não podem ser trabalhadas para que se tornem algo mais positivo. O primeiro passo é reconhecer que elas existem e que devem ser trabalhadas para que não determinem por completo o resto de nossas vidas.
A Umbanda, através de seus ensinamentos, exemplos e práticas, pode ser um grande apoio para situações adversas e também para a formação de seres humanos melhores, começando desde pequeno. Converse com os Guias, leia, aprenda.
Foto: Nappy
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